segunda-feira, 20 de julho de 2015

HISTÓRIAS DO LONINHO

Na viagem a que me referi no último post aqui no blog, conheci um conterrâneo que sabe de muitas histórias. A primeira impressão que tive do Loninho é que ele era bem caladão e que não gostava de conversas. Mas era só coisa de mineiro. Quando se sentiu à vontade, mostrou um bom repertório, no qual prevaleceram os casos de cobras. Imaginei logo que vinha coisa curiosa e engraçada. Temos as mesmas origens e lá pelos  lados de Guaraciaba, têm histórias de cobras que não acabam mais.
A primeira que o Loninho contou confirma a crença que cobra, além de bicho bastante perigoso, é muito traiçoeiro. Disse ele que lá na roça uma vez, certo rapaz encontrou um filhotinho de cobra tão pequenino e frágil, que teve pena do coitadinho. Mesmo sabendo do risco que corria, pois era uma cascavel, resolveu alimentá-la até que crescesse um pouco e pudesse se virar sozinho. Assim  fez, dando leite ao bichinho numa pequena mamadeira. O filhote cresceu sadio e mansinho e nunca incomodou ninguém. Ocorreu que tempos depois, o rapaz teve que ir embora pra São Paulo pra trabalhar e ganhar a vida, como muitos fizeram e ainda fazem lá na região onde nasci. Ninguém nunca mais viu a cobra, até que seis anos depois o rapaz retornou para visitar os parentes. Ao atravessar a porteira, na chegada do sítio onde  morara, a danada da cobra estava enrodilhada no batente da porteira e, de um golpe certeiro, avançou na jugular do seu benfeitor, que caiu  na hora, para nunca mais levantar.
 – Mas pode ter sido outra cobra e não a que ele criou, argumentei.
- Não, foi a mesma, todo mundo viu que foi a mesma, rebateu o Loninho.
- Mas, se for da mesma raça, cobra é tudo igual, como vai saber que foi a mesma?
- É igual, mas é diferente, dá pra reconhecer. Era a cobra que ele havia criado sim. E até hoje, lá na porteira tem a cruz que aponta o lugar exato onde o infeliz foi atraiçoado pela maldita.
Diz o Loninho que  “com cobra não se brinca”.  E que se por acaso, alguém tentar matar uma e não conseguir, apenas machucando-a, ela volta pra se vingar. Pode passar o tempo que for,  que retorna pra picar justamente aquele que a ofendeu. Por isso, golpes para matar cobras têm que ser certeiros. Relata que, certa vez, mãe e filha tentaram matar uma cobra e não conseguiram. Quando retornaram à casa, o bicho  apareceu na cozinha já “com o bote armado” para atacar. Felizmente elas foram mais espertas e, dessa vez, acabaram com o bicho.
Nessas alturas digo a ele (doutrinada pela minha filha, bióloga e ecologista convicta), que agora não pode mais matar cobra, que é crime ambiental. O Loninho concorda, diz que não pode mesmo não. Se o bicho  estiver no terreiro, por exemplo, ou junto com as criações, representando perigo, tem que pegar e soltar no mato, bem longe, ele diz:  “Solta no mato, mas mata primeiro”,
Histórias de cobras são tantas, que se pode escrever longamente sobre elas. Creio que delas a lenda mais conhecida seja aquela que conta que, quando criança recém nascida não está pegando peso e continua muito raquítica é porque tem cobra mamando o leite da mãe. A danada entra à noite, pelas frestas das portas, ou das janelas, aconchega-se no leito da criança, coloca o rabo em sua boca e suga o leite materno, deixando a criança à míngua. Essa história é famosa e foi mostrada no filme Tapete Vermelho de uma maneira bastante engraçada.
Que cobra é bicho muito perigoso e traiçoeiro todo mundo sabe. Por isso tantas analogias são feitas entre esses bichos e determinados comportamentos humanos. Quem nunca ouviu dizer, por exemplo, que “Fulano é cobra criada”?  
Certa vez, ainda quando ocupava o cargo de diretora de uma grande instituição, andava com uma gastrite que incomodava. Procurei um médico homeopata e acupunturista, que foi certeiro.
- Tem engolido muitos sapos? Perguntou-me o doutor.
- É... fazem parte do meu trabalho, respondi.
Pois então, explicou-me o  clínico: quem é “cobra”, engole sapo todo dia e não acontece nada, digere fácil. Mas, pessoas sensíveis como você, não possuem essa capacidade. Então desenvolvem gastrites, úlceras e a outros males decorrentes dessa atividade tão indigesta.
Dizem lá na roça que São Bento é o protetor contra as cobras e outros animais peçonhentos. No geral, ao entrar no mato, as pessoas se benzem, pedindo pela sua proteção. Por via das dúvidas,  não custa nada invocar o santo também nos ambientes de trabalho. Afinal de contas, como ensina a sabedoria popular, cobras estão por todos os lados, mesmo nos mais improváveis.

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