Tenho estado em Belo Horizonte, auxiliando no acompanhamento
de uma irmã com delicados problemas de saúde. Por conta disso, pouco tempo para
ler e menos oportunidades para escrever. Na semana passada, retornando aonde
moro, para concluir as atividades acadêmicas do semestre, tive um grande
privilégio: o de viajar com dois bons contadores de histórias.
Os que, como eu, gostam de escrever, apreciam boa conversa, matéria prima de relatos interessantes.
No post anterior, falei das belezuras das poucas flores de
junho, destacando o Cipó de São João. Na viagem avistei alguns
maciços dele, logo na saída de BH para Ouro Preto. Expressei meu contentamento
por haver fartura da espécie por lá, ao contrário do que está acontecendo em
minha vizinhança.
Olha ele aí, o cipó milagroso |
Ao falar da boniteza da planta, um dos companheiros de viagem, o Luizinho, perguntou se eu
conhecia todos os poderes dela, ao que respondi que ainda não ouvira falar. Foi a deixa para
que ele, nascido e criado na roça (assim como eu) e de uma família de 12 irmãos, relatasse casos muito interessantes.
Contou-nos que a noite de São João era uma das mais movimentadas
na sua família. Não porque saíssem todos a se divertirem nos festas do Santo, mas por causa das obrigações a que
eram submetidos na ocasião.
O Cipó de São João, segundo as crenças e tradições de
sua família, é remédio milagroso para frutíferas. Quando
há, por exemplo, um pé de laranja que deixa de produzir frutos, é bom que na madrugada do dia 24 de junho, faça-se um
chicote amarrando diversas ramas do Cipó de São João em um cabo bem
resistente e, sem dó, aplica-se uma boa “coça de coro”, na árvore, não importando
se folhas cairão, ou mesmo se alguns galhos mais tenros serão danificados.
Bate-se sem piedade e, no ano seguinte, pode-se contar como certo o milagre de São João: aquele pé de laranjeira
que praticamente não estava mais prestando pra nada, carrega de frutas que é
uma beleza.
Ainda em relação aos cítricos, contou também o Luizinho, que quando se tem um pé de laranja em casa que,
sendo naturalmente doce, começa a produzir frutos muito azedos, na madrugada do
dia 24 de junho, durante o sereno de São
João, devem ser jogados, com as mãos, diversos punhados de açúcar nas folhas da
laranjeira. Depois é só esperar, que no ano seguinte, os frutos voltam a ser
doces como nunca.
E tem mais: quando pés
de manga e, ou de abacate não estiverem produzindo bem, é suficiente que, na
noite de São João façam-se, com um machado, alguns piques nas cascas das árvores, para que, no ano seguinte, a produção volte a ser farta.
A viagem, que normalmente demora de três e meia a quatro
horas, passou num instantinho. Mas não chegamos antes que ele contasse que
em sua família, todos os doze irmãos gozam de boa saúde, assim como pai e mãe, que
já estão bem idosos. Uma das razões, segundo relatou é que, quando crianças,
a mãe tirava a filharada da cama na madrugada do dia 24 de junho e levava os
doze, em fila, primeiro para lavarem o rosto na água da mina e depois para ficarem
expostos ao sereno de São João durante algum tempo. Essa aragem fria da
madrugada, segundo sua mãe lhe ensinou, é um santo (sem trocadilhos) remédio pra
saúde.
Por essas e outras, já me decidi. Mesmo que esteja a maior friagem, como é de se esperar e, por mais sonolenta que eu seja, no próximo ano, não vou perder o sereno da madrugada de São João. Além
do mais, tenho um pé de laranja campista plantado em meu quintal há mais de dez
anos e que nunca deu uma flor sequer. Apesar de não estar fácil encontrar o cipó
de São João em boas quantidades, vou me esforçar para fazer um chicote bem caprichado. Pretendo dar uma
coça das boas no meu pé de laranja caipira, pra ver se, como dizem os
meus alunos, consigo dar um “upgrade”
no bichinho.
Em tempo: em um próximo post vou relatar as histórias que ouvi do outro companheiro de viagem, o Loninho.
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