quinta-feira, 22 de março de 2012

Falta de Tempo

Me dou conta que há mais de uma semana não posto algo no blog. Hoje não me vem outro tema que não seja esse: o que fazer com a eterna falta de tempo que nos atormenta na atualidade, até para uma "mulher a toa" como é o meu caso? Trabalho pouco, mas quero fazer muita coisa. Não abro mão de ser uma mãe presente e participativa. Gosto de cultivar a família e as amizades. Quero cuidar do jardim e estar antenada com as notícias do mundo. Ter tempo para a Yoga e a caminhada. Também não abro mão de cozinhar de vez em quando. Descobri como é gratificante a realização de um trabalho comunitário. Ultimamente tenho descoberto o quanto é interessante a participação política e lutar por causas nas quais acreditamos. Mas não sou ninguém sem leitura e, principalmente sem poesia. Não posso ficar sem um bom filme. Há mais de uma semana não pego a máquina fotográfica e saio por aí lançando meu olhar curioso sobre um novo tema. Tem coisas esporádicas como as viagens, por exemplo, que ultimamente têm sido mais frequentes e das quais não abro mão. Assim nos encontramos praticamente todos, ávidos por uma vida plena, conscientes do quanto é rápida a nossa passagem por esse mundo cruel, mas divertido e pleno de opções. Por isso, buscamos cada vez mais, nos equilibrar nessa perigosa e emocionante corda bamba de dores inevitáveis e prazeres diversos. Assim somos, ou melhor, assim estamos.

quarta-feira, 14 de março de 2012

ESCRAVA DA POESIA

Já na apresentação deste Blog me declarei escrava da poesia. Esse relação começou cedo. Lembro-me de, aos sete anos de idade, encantar-me com o Leilão de Jardim da Cecília Meirelles. Assim, me rendo a essa paixão há muito tempo. Não sou capaz de entender como alguém pode viver sem poesia. Sendo hoje o seu dia, não posso deixar de postar uma aqui. Na dúvida entre qual escolher, dada a enorme quantidade de belos poemas da nossa língua, decido por aquela que despertou-me para esse mundo encantado. É incrível perceber como, ao serem arranjadas de maneira especial, as palavras de um poema imprimem um ritmo, uma leveza e uma cadência tão especiais que são capazes de despertar as mais profundas emoções. Apreciem a singeleza e deixem-se levar pelo encantamento do Leilão de Jardim.


LEILÃO DE JARDIM


Cecília Meirelles


Quem me compra um jardim com flores?
borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?

Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?

Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentrodo chão?

(Este é meu leilão!)

Estou postando hoje também em Poemas, um poeminha meu, onde manifesto meu enorme desejo de ser poeta. Veja lá.

segunda-feira, 12 de março de 2012

TELE MARKETING - o reverso da madalha

Não é agradável ser incomodado em casa com um telefonema de um desconhecido lhe oferecendo uma quinquilharia qualquer. Você gosta quando abre a sua caixa de correio eletrônico e a encontra saturada de mensagens com propaganda? Se não lhe agradam tais práticas, ou se você trabalha em empresas que as adotam, não deixe de ler o texto em que trato desse assunto. No meu caso, que adoro um sossego e busco incessantemente por qualidade de vida, nesse mundo insano, tais abordagens são verdadeiras amolações. Por isso alerto às empresas que praticam o telemarketing: se querem continuar me vendo como cliente potencial, não me telefonem, que eu viro bicho. E a possibilidade de eu vir a adquirir um produto ou contratar um serviço delas é praticamente nula.
Veja em SEM BRINCADEIRA

segunda-feira, 5 de março de 2012

UM TEMPO SEM NOME

Não é difícil entender porque praticamente todas amamos Chico Buarque. Agora Rosiska Oliveira nos brinda com essa delícia de texto que, assim como a poesia do eterno galã, é seda pura de palavras. A seguir você pode apreciar primeiramente a letra da música que inspirou o texto e, na sequência, o próprio.

Essa Pequena

Chico Buarque

Meu tempo é curto, o tempo dela sobra
Meu cabelo é cinza, o dela é cor de abóbora
Temo que não dure muito a nossa novela, mas
Eu sou tão feliz com ela

Meu dia voa e ela não acorda
Vou até a esquina, ela quer ir para a Flórida
Acho que nem sei direito o que é que ela fala,mas
Não canso de contemplá-la

Feito avarento, conto os meus minutos
Cada segundo que se esvai
Cuidando dela, que anda noutro mundo
Ela que esbanja suas horas ao vento, ai

Às vezes ela pinta a boca e sai
Fique à vontade, eu digo, take your time
Sinto que ainda vou penar com essa pequena, mas
O blues já valeu a pena.


UM TEMPO SEM NOME

Rosiska Darcy de Oliveira, O Globo, 21/01/12

Com seu cabelo cinza, rugas novas e os mesmos olhos verdes, cantando madrigais para a moça do cabelo cor de abóbora, Chico Buarque de Holanda vai bater de frente com as patrulhas do senso comum. Elas torcem o nariz para mais essa audácia do trovador. O casal cinza e cor de abóbora segue seu caminho e tomara que ele continue cantando “eu sou tão feliz com ela” sem encontrar resposta ao “que será que dá dentro da gente que não devia”.
Afinal, é o olhar estrangeiro que nos faz estrangeiros a nós mesmos e cria os interditos que balizam o que supostamente é ou deixa de ser adequado a uma faixa etária. O olhar alheio é mais cruel que a decadência das formas. É ele que mina a autoimagem, que nos constitui como velhos, desconhece e, de certa forma, proíbe a verdade de um corpo sujeito à impiedade dos anos sem que envelheça o alumbramento diante da vida .
Proust, que de gente entendia como ninguém, descreve o envelhecer como o mais abstrato dos sentimentos humanos. O príncipe Fabrizio Salinas, o Leopardo criado por Tommasi di Lampedusa, não ouvia o barulho dos grãos de areia que escorrem na ampulheta. Não fora o entorno e seus espelhos, netos que nascem, amigos que morrem, não fosse o tempo “um senhor tão bonito quanto a cara do meu filho“, segundo Caetano, quem, por si mesmo, se perceberia envelhecer? Morreríamos nos acreditando jovens como sempre fomos.
A vida sobrepõe uma série de experiências que não se anulam, ao contrário, se mesclam e compõem uma identidade. O idoso não anula dentro de si a criança e o adolescente, todos reais e atuais, fantasmas saudosos de um corpo que os acolhia, hoje inquilinos de uma pele em que não se reconhecem.
E, se é verdade que o envelhecer é um fato e uma foto, é também verdade que quem não se reconhece na foto, se reconhece na memória e no frescor das emoções que persistem. É assim que, vulcânica, a adolescência pode brotar em um homem ou uma mulher de meia-idade, fazendo projetos que mal cabem em uma vida inteira.
Essa doce liberdade de se reinventar a cada dia poderia prescindir do esforço patético de camuflar com cirurgias e botoxes — obras na casa demolida — a inexorável escultura do tempo. O medo pânico de envelhecer, que fez da cirurgia estética um próspero campo da medicina e de uma vendedora de cosméticos a mulher mais rica do mundo, se explica justamente pela depreciação cultural e social que o avançar na idade provoca.
Ninguém quer parecer idoso, já que ser idoso está associado a uma sequência de perdas que começam com a da beleza e a da saúde. Verdadeira até então, essa depreciação vai sendo desmentida por uma saudável evolução das mentalidades: a velhice não é mais o que era antes. Nem é mais quando era antes. Os dois ritos de passagem que a anunciavam, o fim do trabalho e da libido, estão, ambos, perdendo autoridade. Quem se aposenta continua a viver em um mundo irreconhecível que propõe novos interesses e atividades. A curiosidade se aguça na medida em que se é desafiado por bem mais que o tradicional choque de gerações com seus conflitos e desentendimentos. Uma verdadeira mudança de era nos leva de roldão, oferecendo-nos ao mesmo tempo o privilégio e o susto de dela participar.
A libido, seja por uma maior liberalização dos costumes, seja por progressos da medicina, reclama seus direitos na terceira idade com uma naturalidade que em outros tempos já foi chamada de despudor. Esmaece a fronteira entre as fases da vida. É o conceito de velhice que envelhece.
Envelhecer como sinônimo de decadência deixou de ser uma profecia que se autorrealiza. Sem, no entanto, impedir a lucidez sobre o desfecho. ”Meu tempo é curto e o tempo dela sobra”, lamenta-se o trovador, que não ignora a traição que nosso corpo nos reserva. Nosso melhor amigo, que conhecemos melhor que nossa própria alma, companheiro dos maiores prazeres, um dia nos trairá, adverte o imperador Adriano em suas memórias escritas por Marguerite Yourcenar.
Todos os corpos são traidores. Essa traição, incontornável, que não é segredo para ninguém, não justifica transformar nossos dias em sala de espera, espectadores conformados e passivos da degradação das células e dos projetos de futuro, aguardando o dia da traição. Chico, à beira dos setenta anos, criando com brilho, ora literatura, ora música, cantando um novo amor, é a quintessência desse fenômeno, um tempo da vida que não se parece em nada com o que um dia se chamou de velhice. Esse tempo ainda não encontrou seu nome. Por enquanto podemos chamá-lo apenas de vida.