sábado, 30 de março de 2024

SOBRE PLANTAS E INTELIGÊNCIA

 

        A reforma do pensamento requer um questionamento radical que desanima as pessoas(Edgar Morin, em Meus Demônios. Bertrand Brasil, 2000, p. 185).


Resenha do livro: Revolução das Plantas Stefano Mancuso. São Paulo: Ubu Editora, 2019.


 A não ser pelo fato de que ambos são seres vivos, animais e plantas diferem-se de tal maneira que pode-se  chegar a crer que além dessa característica, nada mais possuam em comum. Enquanto animais, no geral locomovem-se e precisam buscar sua comida  para sobreviver, as plantas  fabricam seu próprio alimento e são entes de estruturas fixas. Além dessas destacadas diferenças, a incapacidade de aprender, dada a ausência de memória no mundo vegetal, vinha sendo considerada particularidade determinante a distinguir entre os dois entes.

O livro Revolução das plantas do biólogo e pesquisador italiano Stefano Mancuso, publicado no Brasil pela Editora Ubu,  apresenta um novo olhar sobre o reino vegetal, com conceitos e ideias muito surpreendentes para a maioria das pessoas.

O livro recebeu o prêmio Galileo de
divulgação científica no ano de 2018

O autor informa que o comportamento de plantas vem sendo estudados pela ciência desde pelo menos o século XVIII,  e que afinidades entre os reinos animal e vegetal no que concerne à capacidade de cognição e aprendizagem das plantas vem sendo descobertas desde então.

Perguntando se é possível existir memória sem  cérebro, esse livro nega o conceito de passividade das plantas, ao afirmar que elas são formas de vida  bastante sofisticadas. Por apresentarem comportamentos interessantes, ainda que não possuam cérebro, encontram formas particulares de criarem e reterem memórias, sendo capazes de assumir novos comportamentos.  

Também as plantas podem praticar o mimetismo a seu favor, fortalecendo a capacidade de sobreviver e surpreendendo-nos com o quanto têm a ensinar. A busca pela sobrevivência e pela evolução ao longo dos anos dotaram as plantas de sabedorias milenares que, ao serem descobertas tem surpreendido cientistas em todo o mundo. Comportamentos tão aprimorados das plantas podem e vem sendo utilizados para inspirar soluções para problemas humanos de alta complexidade. Mais recentemente suas estruturas e propriedades têm sido utilizadas até para a construção de protótipos  de sondas de exploração espacial. Os chamados robôs plantóides já estão sendo utilizados experimentalmente por laboratórios da NASA, com perspectivas de uso na busca de conhecimentos sobre outros planetas.

A maneira como as plantas coexistem na natureza e convivem com as diferenças, colaborando entre si no processo evolutivo, desenvolve uma espécie de inteligência coletiva,  que favorece a sobrevivência e  inspira estudos sobre  novos sistemas de governança cooperativa baseada na  descentralização como em uma árvore, por exemplo, e não com funções e atribuições dispostas em hierarquias. O autor enaltece tais características expressando o conceito de democracia verde, apontando como  modelo de gestão do futuro.

As palavras chaves da ficha catalográfica do livro são: Ecologia, Biologia, Ciências Sociais e Robótica; a obra contem relatos de diversas experiências científicas, discorre sobre propriedades e funções de órgão das plantas e de mecanismos que envolvem complexos emaranhados de reações físicas e químicas que ocorrem no seu interior. Ainda assim, a  leitura é acessível aos leigos, sendo, ao contrário do que se possa pensar ao início, muito didática e interessante. Em algumas partes, como no último capítulo, por exemplo, a escrita  chega a ser até muito bem humorada.