quinta-feira, 25 de julho de 2019

DIA DE SÃO CRISTOVÃO


“São Cristóvão, protegei-me nas minhas idas e vindas e ensinai-me a viver com alegria!”.

Conta a lenda que São Cristóvão era um homem muito grande, quase um gigante, que vivia em busca da verdade e de conhecer um mestre genuíno. Chegou a ser enganado por forças do mal que levaram-no a acreditar que, por seu tamanho muito acima da média, deveria cultivar a mania de grandeza, poderia ser orgulhoso e considerar-se detentor de poder e glória.
Nessa procura, no entanto, certa vez foi aconselhado por um eremita a, justamente por ser tão alto, postar-se diante de um rio de difícil travessia para ajudar os que tentassem nele atravessar.
Certa feita foi solicitado a ajudar na travessia de um menino. Ao transportar, para a outra margem do rio, a criança nos seus ombros pareceu-lhe extremamente pesada. Ao finalizar o transporte, cansado e arquejante sobre o seu cajado, soube que, quem carregava era ninguém menos que o Menino Jesus.

Assim, de maneira milagrosa, São Cristóvão compreendeu que homens deveriam ser apreciados pela bondade para com o próximo e não pela sua grandeza. Ao converter-se, foi perseguido e condenado a ser decapitado, tornando-se mártir.

Apesar de ser um dos santos mais populares do mundo, venerado por católicos e umbandistas, pouco se sabe ao certo, a respeito da vida do santo. Ele teria nascido em Canãa, sido batizado com o nome de Réprobo, antes de assumir o nome de Cristóvão, o carregador de Cristo; viveu no século III, d.C.,  e  teria morrido  no reinado do imperador romano Décio.
Por ter tido a sublime ventura de transportar Jesus nos ombros, geralmente é assim representado e foi consagrado como padroeiro dos motoristas, condutores  e  viajantes.



quinta-feira, 18 de julho de 2019

PERSONAGENS INESQUECÍVEIS


No cinema ou na literatura  deparamos com personagens inesquecíveis para cada um de nós. Aqui apresento os meus. Alguns deles, talvez componham também a sua lista. Ou não,  podem ser outros, assim como os motivos para escolhê-los também serão bastante pessoais. Assim, cada um de nós diz sobre si, até na escolha dos personagens que admira.
Tanto quanto figuras históricas, artistas de renome ou cientistas que contribuem para o avanço da humanidade, os personagens de ficção também dizem muito sobre a vida, sobre o seu tempo e o seu mundo. Ao seu modo, contribuem para a formação de crenças, costumes e condutas, para muito além de leis, normas e regras da vida institucionalizada.
Mesmo que habitem apenas o espaço da fantasia, esses seres, bem como os acontecimentos do mundo em que vivem, lançam questões sobre a realidade, e jogam faíscas de luz sobre aspectos do comportamento humano, instigando a reflexão e abrindo brechas para a possibilidade de questionamento do que está estabelecido. Embora não existam no mundo real, podem adquirir uma força extraordinária. Não é incomum que seus criadores sejam, muitas vezes, perseguidos, silenciados e até banidos da sociedade, porque denunciam mazelas e injustiças e  contribuem para a manutenção da utopia e da esperança.


1 BENIGNO
Pelas mãos de Pedro Almodóvar, em  Fale com Ela, descobre-se um personagem antológico. Benigno é desses sujeitos que o tempo passa e a gente não esquece. Uma atuação memorável do ator espanhol, Javier Cámara, para dar vida a essa criatura enigmática e complexa que  é o personagem em questão. Enfermeiro e cuidador da própria mãe, o rapaz se enamora por uma bailarina, Alícia,  que ensaia suas danças em uma academia que fica diante da janela da casa dele.
Quando morre a mãe de Benigno e, devido a um acidente, a moça entra em estado de coma, ele passará a ser seu enfermeiro e cuidador. Nessa condição, Benigno entra em contato com um jornalista que acompanha sua namorada, uma toureira, também em coma. O desenrolar dessa história, aparentemente insonsa, pela mente engenhosa e pela direção hábil e experiente do grande Pedro Almodóvar, é de uma criatividade inigualável. A delicadeza da dança, que pontua o filme em diversos momentos de extrema beleza, harmoniza perfeitamente com a fragilidade e a ternura dos personagens envolvidos. Durante o filme inteiro, Benigno rouba todas as cenas, sendo o senhor dos sonhos, fantasias e surpresas do expectador desse grande filme
  
2 CABÍRIA
Quando se vê pela primeira vez o cartaz do filme Noites de Cabíria, do diretor italiano Frederico Fellini, raramente se imagina a preciosidade que há naquela história. Obviamente não por ser antigo, o cartaz do filme é feio e desengonçado. A embalagem definitivamente não condiz com o produto que apresenta.
Cabíria é uma pequena e frágil mulher que tenta sobreviver fazendo programas pelas ruas da cidade. Uma prostituta romântica, esperançosa e crédula, que teima em idealizar o amor verdadeiro, mesmo passando por uma decepção atrás da outra.
E nesse seu sofrido périplo, ela nos encoraja inspira e instiga a continuar acreditando, mesmo que a vida esteja a nos passar uma rasteira atrás da outra.
Cartaz do filme Noites de
Cabíria


Nesses tempos de ódio e de fascismo, personagens como Cabíria são necessários e vitais, para que sigamos com esperança, acreditando em utopias.

3  CALVERO

Dentre o rol de personagens memoráveis de Chaplin, não há como não se derreter por Calvero, de Luzes da Ribalta.
Um artista velho e em decadência, que já teve fama e glória em palcos importantes, agora vive desanimado e anda exagerando na bebida. Mesmo nesse estado, acaba salvando a vida de uma jovem, em profunda depressão, que tentara o suicídio. Ao cuidar dela e durante a recuperação, acaba se apaixonando e adquirindo, ele mesmo, um pouco de ânimo e disposição para retomar sua carreira. No entanto, mesmo mais autoconfiante, sua tentativa de voltar aos palcos não é bem sucedida e ele torna-se um artista de rua.
Em uma passagem memorável, ele acaba sendo reconhecido e referido como “o grande Calvero” ao que o personagem retruca: “Ninguém vive o suficiente para ser mais do que um aprendiz”.
Prestes a completar um século, esse filme e seu personagem principal continuam a povoar a memória dos amantes do cinema e da arte de maneira geral. Uma obra prima de um dos maiores artistas do século XX. O desfecho da história, lindo e comovente, não nos deixa esquecer que estamos diante de uma peça de Charles Chaplin, um dos precursores e grande mestre do cinema.

  
4 CAPITU

Mesmo já tendo completado cem anos o romance D. Casmurro, de Machado de Assis, conta uma história muito atual.
Uma mulher linda, inteligente, desenvolta e, desde criança, sedutora e  carismática vai viver um romance e um casamento com um parceiro inseguro, ciumento e mimado.
Não é apenas Bentinho, o marido possessivo, que lança sobre ela olhares de desconfiança a todos os momentos. Durante o desenrolar da história, o narrador inferniza seu leitor, a todo instante, invocando-o pessoalmente a julgar  as condutas da mulher que ele chamou de “cigana oblíqua e dissimulada”. Parece-me pesada a carga de preconceito que a expressão carrega! 
A história concentra-se nas reflexões do marido a respeito do seu romance com Capitu, pontuando o relato com um tom forte de ironia, pessimismo e descrença. Deixa vazar sem pudores toda a desconfiança de uma mente doentia, como se pretendesse fazer nascer a fórceps, a certeza de uma traição que nem ele próprio sabe se houve. 
Capitu resiste, e permanece na mente dos leitores dessa obra prima, como uma das personagens mais importantes da literatura brasileira de todos os tempos.


5 DIADORIM

Por coincidência, aqui na lista em ordem alfabética, emparelham-se os dois personagens mais importantes da literatura brasileira: Capitu e Diadorim.
Diadorim, ou  Reinaldo, como muitas vezes é referido em Grande Sertão: veredas, a obra prima de Guimarães Rosa, é um personagem enigmático e ambíguo.
Doce como um pequeno passarinho cantador, ou corajoso e obstinado tal qual uma onça faminta, ele caminha em meio às asperezas de um sertão onde as leis não chegam, junto com bandos de jagunços violentos e sanguinários. Valente e meigo, Diadorim deixa transparecer em seus olhos uma inevitável solidão que acaba, em variadas medidas, sendo a marca da existência de todos nós.
Diante da saga de Diadorim, podemos nos perguntar: - Que escolhas a vida nos proporciona?


6  D. QUIXOTE

Há mais de quatrocentos anos ele figura como o personagem mais importante da literatura universal, de todos os tempos.
Magro, romântico, sonhador, obstinado e crédulo. Tanto que é capaz de acreditar nas histórias que lê, e de se transformar num personagem, misturando ficção e realidade a ponto de ter alucinações e ser considerado louco.
O romance D. Quixote, de Miguel de Carvantes,  além de ser uma obra prima universal de qualidade inquestionável, inspira há anos, outros artistas de diversas linguagens, sendo sinônimo de talento e criatividade.
Tenho motivos de sobra para me encantar por esse fidalgo, o maior deles, com certeza, a proximidade de características do personagem com a personalidade de meu pai.

7  FLORENTINO ARIZA

Florentino Ariza é um amante charmoso, romântico e encantador criado pelo genial colombiano, Gabriel Garcia Marques, prêmio Nobel de Literatura, em  O Amor nos Tempos do Cólera.
Esse homem obstinado, capaz de fazer resistir uma paixão tão duradoura e uma promessa de amor eterno, consegue encher de júbilo os corações dos românticos. Afinal quem não se apaixona por esse sedutor, capaz de esperar o amor de uma mulher por 53 anos, sete meses e 11 dias?
Como não se encantar com a firmeza e a obstinação com que ele enfrenta até ameaças de morte, em nome de concretizar seu sonho de ter  Fermina Daza?


8 MADAME FRANCINETE

É impressionante como, mesmo diante da brevidade da narrativa de um conto, um autor genial consegue construir um personagem inesquecível. O argentino Júlio Cortázar fez isso com uma maestria digna de registro.
No conto Os Bons Serviços, que compõe o livro  As Armas Secretas, tal proeza se realiza com Madame Francinete, uma faxineira parisiense,  prestes a se aposentar, que acaba sendo convidada a executar serviços inusitados.
Com a proximidade da velhice e diante das restrições econômicas em que vive, a personagem faz reflexões sobre a solidariedade, a pobreza, as injustiças sociais e as idiossincrasias humanas. Tudo isso com um humor ácido, registrando a hipocrisia predominante entre as classes sociais mais abastadas e a invisibilidade dos pobres, sem no entanto, nenhum engajamento político.

9  TIRÉSIA

Uma travesti brasileira se prostitui nas ruas de Paris. É uma mulher meiga, delicada e feminina, ficando longe das figuras caricatas que geralmente caracterizam esse grupo.
A atração que exerce sobre um homem é doentia, levando-o a aprisioná-la e cultuá-la como o mais precioso objeto do seu desejo. Isso não o impede no entanto, de cometer atrocidades em nome desse suposto sentimento.
Nesse filme de produção franco canadense, mito e realidade se intercedem, resultando na criação de uma das personagens mais interessantes do cinema, que pude conhecer.

10  UM ARTISTA DA FOME

Dele não ficamos sequer sabendo o nome. No entanto, mesmo sendo personagem de narrativa curta, Um Artista sem Nome, conto de Kafka, em livro com o mesmo título, fica facilmente registrado na memória dos que o leem.
O protagonista de mais esse conto extraordinário é um obstinado artista cuja façanha é apresentar-se publicamente por longos e sucessivos dias, em uma jaula, sem ingerir nenhum tipo de alimento, como o nome sugere. Vigiado constantemente pelo público, o personagem cumpre com rigor absoluto os rituais de sua arte. Os que o assistem não estão propriamente interessados nela, já um tanto fora de moda, mas sim em assegurar que ele não fraquejará em seu intento.
Uma preciosa reflexão  sobre a vida e sobre como tudo muda, permanecendo a arte, no entanto, como uma marca indelével da condição humana.