domingo, 29 de outubro de 2023

QUEM TEM MEDO DE BRUXAS?

 

Dia das bruxas vem ai. É logo depois de amanhã e tem polêmica nas redes sociais. Alguns, entre os quais me incluo, criticam a mania de boa parte da população brasileira de imitar costumes estadunidenses. Por lá parece que a farra é boa nesse dia, especialmente para as crianças, que já desde cedo são incentivadas a obter benefícios na base da troca, ou pior: da ameaça. Gostosuras ou travessuras, bradam os pequenos. Caso em alguma residência, não obtenham o que pediram, estão autorizados pelos pais e pelo costume a jogarem sujeiras, rabiscarem os locais, ou fazer algumas  malcriações.

Outros, principalmente  pessoas religiosas fundamentalistas (e como anda tendo esse tipo de gente no Brasil nos últimos tempos!), vivem bradando que o uso de fantasias horripilantes, maquiagens cadavéricas e assombrações feitas de abóbora são “coisas do encardido” e que tais costumes devem ser renegados, porque abrem as portas para a entrada do dito cujo nas famílias e nas casas.

Embora considere a festa no modelo mencionado uma bobagem, mais um americanismo entre muitos outros, a comemoração por si mesma de um dia dedicado às bruxas soa-me até como algo bastante simpático, porque tenho admiração por elas e às vezes até me sinto uma delas.

Rosas e vela branca, além de espada de São Jorge, flores
de cebola e alecrim entre outras ervas: uma bruxariazinha
 de vez em quando faz muito bem.

Mulheres, historicamente, têm sido relegadas a um papel secundário nas sociedades de forma geral e o reconhecimento de seus feitos ainda é tabu entre boa parte de homens e instituições. Sabe-se por exemplo, que o consumo de cerveja é habito milenar em boa parte do mundo. No entanto, é pouco divulgado que as primeiras pessoas responsáveis pela fabricação da bebida foram mulheres. Como responsáveis pela coleta, armazenamento e conservação de grãos desde os primórdios da humanidade, acabaram descobrindo a fórmula da elaboração da bebida e também das propriedades do lúpulo. Dele extraem-se substancias que dão aroma à bebida, e detém a proliferação de bactérias, além de melhorar a qualidade da espuma. Quando os homens quiseram apropriar-se do conhecimento e do domínio da fabricação da bebida tão apreciada, taxaram-nas de bruxas e feiticeiras.

Bastante tempo depois, no século XII, a freira alemã Hildegarda von Bingem foi a primeira pessoa a registrar as propriedades do lúpulo, em artigo escrito e publicado. Essa freira, que depois foi elevada à categoria de santa, foi uma das primeiras médicas que elaborou estudos bioquímicos ainda hoje prevalecentes, sendo mentora de algumas correntes atuais da nutrição e da medicina. Pouca gente já ouviu falar dela, e alguns preferem classificá-la como uma bruxa, uma mulher misteriosa detentora de muitos segredos.

No entanto,  para falar de bruxas e comemorar seu dia, nem precisamos ir tão longe na história. A cantora e compositora Rita Lee, uma mulher independente e desbocada, jamais se furtou a assumir o seu lado bruxa, especialmente no período da velhice. Antes já dissera que “mulher é bicho esquisito, todo mês sangra” e gravado a música Bruxa Amarela

 “Duas horas da manhã eu abro a minha janela

E vejo a bruxa cruzando a grande lua amarela

......................................................................”                                                                                                                  

Considerando-me uma delas, não posso duvidar de sua existência. Vivem disfarçadas em mulheres comuns, donas de casa, mães de filho, jardineiras, benzedeiras, escritoras, cozinheiras, fazem não uma, mas centenas de bruxarias por dia. Fazem parto, curam umbigos, benzem, consolam e reanimam, realizam verdadeiros milagres ao manobrarem seus horários entre trabalho, casa, cuidados com filhos e idosos, entre tantas coisas mais. Merecem ser comemoradas.