Minha mais recente descoberta literária é Wislawa
Szymborska. Nome quase impronunciável em nossa língua, a escritora polonesa,
embora tenha uma obra curta, ganhou o prêmio
Nobel de literatura , em 1996. Morta no ano passado, a poeta empregava uma
linguagem simples e moderna, utilizando um tom irônico e realista. O poema a
seguir, parece ter sido escrito para o
momento que estamos vivenciando no Brasil.
Filhos da época
Somos filhos
da época
E a época é
política
Todas as
tuas, nossas, vossas coisas
Diurnas e
noturnas
São coisas
políticas.
Querendo ou
não querendo,
teus genes têm um passado político,
tua pele, um
matiz político, teus olhos, um aspecto político.
Até caminhando
e cantando a canção
Você dá
passos políticos
Sobre um solo
político
Versos apolíticos
também são políticos, e no alto a lua ilumina
Com um brilho
já pouco lunar.
Ser ou não
ser, eis a questão.
Qual questão,
me dirão.
Uma questão
política.
Não preciso
nem mesmo ser gente
Para ter
significado político.
Basta ser
petróleo bruto,
Ração concentrada
ou matéria reciclável.
Ou mesa de
conferência cuja forma
Se discutia
por meses a fio:
Deve-se
arbitrar sobre a vida e a morte
Numa mesa
redonda ou quadrada.
Enquanto isso
matavam-se os homens,
Morriam os
animais,
Ardiam as
casas,
Ficavam ermos
os campos,
Como em
épocas passadas
E menos
políticas.
(In: WISLAWA
SZYMBORSKA [poemas]. Tradução Regina Przybycien. São Paulo: Cia das Letras,
2011).
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