Dentro do programa da disciplina Administração de Recursos Humanos somos convidados a discutir sobre o futuro da gestão de pessoas. Quase
sempre me posiciono “com um pé atrás” diante dos diversos ensaios, artigos e
previsões que surgem nos livros, revistas e na internet fazendo conjecturas
sobre esse tema. Vejo com certa reserva previsões e prognósticos a
respeito do futuro de qualquer área, por mais que a ciência tenha avançado em termos de predição e previsão
de fenômenos.
Costuma-se
falar muito em tendência mundial. Como se o mundo fosse um ovo e o que
acontecesse em um país ou região tivesse, obrigatoriamente, que ocorrer em outras
partes do planeta. Nada mais inadequado do que fazer generalizações, em um mundo, felizmente,
ainda diversificado.
Ao mesmo
tempo em que se observa, em países
desenvolvidos ou em desenvolvimento, tendência de fortalecimento das grandes
corporações e de seus impactos sobre a
vida de maneira geral, por outro lado, mesmo em países altamente
evoluídos nota-se, por exemplo certo retorno a hábitos e costumes considerados
provincianos. Enquanto entre a população das megalópoles, o consumo de
industrializados é habitual e sua aquisição é feita geralmente em hipermercados,
onde se vende desde o pão ao automóvel, boa parte da população da Holanda e da Alemanha,
por exemplo, nos dias de hoje, consume produtos orgânicos feitos em pequena
escala e distribuídos em simples mercados e feiras de bairros.
Ainda
assim, observamos processos que parecem sem volta. Por exemplo: a produção de maneira geral tende a ser feita com uso de alta tecnologia; a automação é um caminho consolidado, principalmente em atividades que envolvem esforço físico e dispêndio
muscular elevado. Trabalhos insalubres e perigosos serão, cada vez
mais, efetuados com o auxílio de máquinas e robôs.
Trabalhadores
estarão cada vez mais capacitados e bem informados. Como tal, a tendência é que sejam também mais
exigentes em termos de respeito aos direitos e condições de trabalho, e à
qualidade das relações humanas. A internet, a conexão global e a comunicação em
tempo real, paulatinamente vão “dando voz às pessoas”, democratizando as
informações e possibilitando visibilidade e controle social sobre ações de
organizações, grupos econômicos e decisões arbitrárias de forma geral.
Para que
isso efetivamente aconteça e as liberdades individuais sejam respeitadas,
torna-se necessário que as pessoas sejam cidadãos não somente bem
informados, mas com pensamento crítico e não suscetíveis a se tornarem massa de
manobra da mídia e do marketing, ferramentas cada vez mais eficazes na
manipulação de desejos e pensamentos das pessoas. Neste sentido vale a pena
retomar alguns pontos do pensamento do grande educador brasileiro, Paulo Freire:
"O discurso da
globalização que fala da ética esconde, porém, que a sua ética é a ética do
mercado e não a ética universal do ser humano, pela qual devemos lutar
bravamente se optamos, na verdade, por um mundo de gente”
"A liberdade de comércio não pode estar acima da liberdade do ser
humano". “Para que tenhamos um
homem autônomo, a liberdade e a dignidade humana não podem ser desrespeitadas
ou esquecidas em favor dos interesses de grupos econômicos”.
Quando adota
inteiramente as práticas e o tipo de personalidade que lhe são oferecidos pelos
padrões culturais vigentes e predominantes, o indivíduo deixa de ser ele mesmo, passando a agir orientado pelo que faz a
maioria, sem refletir sobre as razões de sua conduta.
Esse é o comportamento esperado pelas grandes
corporações, movidas, na maioria das vezes, apenas pelo desejo de lucrar cada
vez mais. A acriticidade leva as pessoas
a serem facilmente transformadas em
“massa de manobra”, dominadas pelo consumismo desenfreado, tal como os
detentores do capital desejam. Você já ouviu falar de obsolescência programada?
Sabia que grande parte da indústria atualmente faz produtos com prazo de
duração pequeno, para fomentar mais
consumo? Já pensou onde vai parar todo o lixo, resultante do descarte cada vez
mais veloz de produtos que poderiam ainda estar em uso?
Na disciplina
Administração de Recursos Humanos estudamos técnicas e aprendemos métodos que, aplicados ao contexto das
organizações, podem melhorar a sua efetividade e favorecer a obtenção de
resultados mais favoráveis. Não podemos esquecer, no entanto, que estamos
falando de gente; organizações, como todas as demais ações humanas, somente farão
sentido se for para melhorar a vida do
maior contingente possível de pessoas, sem lhes retirar a individualidade, nem
desrespeitar suas crenças e valores. A diversidade cultural é nossa grande herança, o que nos faz mais ricos e interessantes.
Quando nos tornamos “massa de manobra” perdemos essa grande possibiidade.
O desafio do futuro da gestão de pessoas? - Favorecer
um ambiente que valorize as diferenças, permita convivências
em harmonia, e que indivíduos, enquanto trabalhadores em organizações,
consigam preservar, mesmo que em parte, sua
diversidade e autonomia.
Ser gestor em um
ambiente dominado por normas e padrões de comportamento rígidos e previamente
determinados, não é difícil. Quanto mais se “robotiza” o sujeito,
permitindo-lhe apenas assumir condutas e comportamentos planejados e sancionados pela organização,
mais fácil se torna, porque mais previsível. Dessa forma, lidar com pessoas
deixa de ser “andar em campo minado”, tornando-se ação rotineira e passível de
ser replicada.
Ao contrário, caso
prevaleça a humanidade, a possibilidade do exercício das diferenças e a perspectiva de cada empregado fazer uso de
sua iniciativa e criatividade, trabalhando
com autonomia, que é, afinal, o desejo de cada um de nós,− nessa hipótese, − creio ser possível prever que a gestão de pessoas será
cada vez mais desafiadora. É enganoso imaginar que possa ser tarefa simples, conciliar os conflitantes interesses entre o capital e o
trabalho.
Querida prima e amiga mais querida ainda:
ResponderExcluirGosto muito de ler os seus texto, sobretudo aqueles que, como este, nos desafiam a pensar.
Estou, como você sabe, em um momento de correria, véspera de uma viagem, mas não posso deixar de manifestar meu apreço por um trabalho tão bem elaborado, com destaque para a coerência da argumentação, fundamentada em paulo Freire.
Entretanto, sou mais "rigorosa" (chata, mesmo) quando penso na possibilidade que você aventa no último parágrafo, porque acredito, com você, que: "... caso prevaleça a humanidade, a possibilidade do exercício das diferenças e a perspectiva de cada empregado fazer uso de sua iniciativa e criatividade, trabalhando com autonomia, que é, afinal, o desejo de cada um de nós,− nessa hipótese," no meu primeiro entender, a "gestão de pessoas" seria desnecessária.Bom mesmo é poder falar disso agora, suscitada pelo seu texto e voltar a falar desse tema quantas vezes pensarmos nele. Abraços, já com saudade, e calorosas festas juninas! Ana Maria.
Querida prima e amiga mais querida ainda:
ResponderExcluirGosto muito de ler os seus texto, sobretudo aqueles que, como este, nos desafiam a pensar.
Estou, como você sabe, em um momento de correria, véspera de uma viagem, mas não posso deixar de manifestar meu apreço por um trabalho tão bem elaborado, com destaque para a coerência da argumentação, fundamentada em paulo Freire.
Entretanto, sou mais "rigorosa" (chata, mesmo) quando penso na possibilidade que você aventa no último parágrafo, porque acredito, com você, que: "... caso prevaleça a humanidade, a possibilidade do exercício das diferenças e a perspectiva de cada empregado fazer uso de sua iniciativa e criatividade, trabalhando com autonomia, que é, afinal, o desejo de cada um de nós,− nessa hipótese," no meu primeiro entender, a "gestão de pessoas" seria desnecessária.Bom mesmo é poder falar disso agora, suscitada pelo seu texto e voltar a falar desse tema quantas vezes pensarmos nele. Abraços, já com saudade, e calorosas festas juninas! Ana Maria.