segunda-feira, 27 de maio de 2024

A TRILHA


Dirigia o automóvel na via esburacada, com curvas e morros. Pedras mal encaixadas, musgos de aspecto úmido e escorregadio.  De um lado, a elevada montanha, do outro, o precipício escuro e sombrio.

Em contraste à rudeza do cenário, ela se vestia a rigor como para um baile antigo. Maquiada e de salto alto, a roupa escura e apertada, com dourados detalhes: bela e desconfortável.

Depois, ela montava um cavalo musculoso, de pelos escovados e crina aparada, e seguiam por uma trilha. Montanhas e precipícios mais próximos. O percurso exigia esforço de ambos.  Botas desconfortáveis torturavam os femininos pés, enquanto ela se indagava como iria a um baile de gala assim vestida. A hora se aproximava impiedosa, o tempo ia se escapando à velocidade da luz.

Aves de rapina cortavam os ares. Com medo, ela se persigna e encara afinal o acontecimento. Músicos exaustos, copos vazios e cinzeiros cheios. Flores murchas pendiam dos vasos. Na pista lateral, jovens dançavam um funk obsceno.

Nos portões de acesso surgem bandos de crianças que vão ocupando o espaço; aulas e brincadeiras começam e pessoas são expulsas por vigias truculentos. Não cabem reclamações ou protestos: tudo estava previsto no estatuto.

Estrada e trilha, automóvel, animal, nada mais havia. Agora avisam que ali não toleram anarquistas