“Ninguém ouviu um soluçar de dor
No canto do Brasil.
Um lamento triste sempre ecoou
Desde que o índio guerreiro foi pro
cativeiro
E de lá cantou
Negro entoou, um canto de revolta
pelos ares
Do Quilombo dos Palmares...” (Canto das três raças de Paulo Sérgio Pinheiro, com música de Mauro
Duarte e interpretação mais conhecida na voz de Clara Nunes).
Lagoa linda e limpa em frente à praia do Atalaia |
A palavra
Sergipe, tem origem na língua tupi e significa rio dos siris. O nome passou por variantes Cirizipe e
Cerigipe que significa ferrão de siri, numa referência ao cacique Serigy, um
dos valentes guerreiros que lutaram contra o domínio ibérico.
Estátua em frente ao Museu da Gente Segipana |
Embora a herança indígena esteja por todo o estado, os habitantes originários foram praticamente dizimados. Seu povo vivia entre os atuais rios Vaza-barris e Sergipe, onde está Aracaju. Depois de três décadas de luta, em 1590, foram vencidos pelos invasores que fundaram a capitania de Sergipe del Rey.
No entanto, a herança indígena continua forte em todo o estado. A capital guarda em seu nome o significado de origem tupi-guarini, (Ará, papagaio e Acaiú, fruto do cajueiro), que resultou em Aracaju, ou cajueiro dos papagaios.
São Cristóvão, a quarta cidade mais antiga do Brasil, foi a primeira capital do estado. Construída em estilo espanhol, hoje tombada como patrimônio nacional e pela UNESCO, a cidade e seu centro possuem grande valor histórico e cultural e as construções do período colonial encontram-se em bom estado de preservação. Ai encontramos artistas de renome como o xilogravurista Arnaldo Oliveira, que nos recebeu carinhosamente em seu ateliê. Da mesma forma fomos tratadas na Casa dos Saberes e dos Fazeres pelas suas simpáticas bordadeiras e pelo Sr Jorge dos Estandartes que aos 88 anos é ícone da cultura popular, e compõe mantos e outras lindas peças artísticas.
Praça de São Francisco em São Critóvão |
Arte têxtil elabora por Sr Jorge dos Estandartes |
Os locais por onde andamos valem muito a pena de serem apreciados. A cidade de Aracaju encontra-se limpa e bem cuidada. Foi planejada e possui um plano diretor que estabelece limites à especulação imobiliária. Os rios não são poluídos e possuem matas ciliares preservadas. Há praias de mar e de rios espalhadas por diversas áreas. A proximidade com o estado da Bahia permite visitas à praia do Saco e Mangue Seco. Próximas ao local onde nos hospedamos, Atalaia, Aruana e Mosqueiros são ótimas opções.
É compensador também pegar a lancha na orla do pôr do sol e fazer um passeio à Croa do Goré, um banco de areia no encontro do rio com o mar, que propicia horas de banho de águas mornas e limpas, vista linda dos mangues que beiram o rio. Quando tais encantos são apreciados juntamente com a caipirinha de frutas e os variados tira-gostos disponibilizados nos barcos bar, ou na única barraca do local, ficam inigualáveis. O barco bar e a barraca permanecem ancorados até próximo ao final da tarde, quando a maré sobe implacavelmente expulsando a gente daquele paraíso.
Da mesma forma, andar um pouco mais por estrada, pegar o barco na praia do saco e depois o buggy pelo caminho de areia para alcançar as praias de Mangue Seco, no estado da Bahia, é um passeio relativamente fácil para quem está hospedado em Aracaju. Incluir uma parada na ilha da Sogra, na volta, incrementa ainda mais um dia cheio de aventuras e pleno de paisagens deslumbrantes.
Mangue Seco (BA) e seus coqueirais |
Saco de Bode: essa linda planta dá nome à praia do Saco |
Tanto o museu da Gente Sergipana, quanto o Memorial
de Sergipe Prof Jouberto Uchoa, são bons espaços para imersão histórica e
cultural do Estado. Especialmente o primeiro, com o acervo de réplicas das obras
de Arthur Bispo do Rosário, juntamente com as estátuas gigantes de figuras do folclore de
Sergipano na parte externa, me encantaram de maneira singular.
Para sintetizar, a viagem ao Sergipe e ao pedacinho
da Bahia nos permitiu observar que é uma região plena de atrações turísticas,
tem um povo muito hospitaleiro e uma cultura muito rica. Entretanto, percebe-se
que a distribuição de renda é injusta como em todo o Brasil e que o povo “canta
de dor”, sem perder de vista sua memória, e sua valiosa ancestralidade.
Voltamos revigoradas por apreciar mais um pouco da
cultura e das imensas belezas desse nosso país, sem deixar de sentir, no
entanto, repercutindo nos ouvidos, o eco dos clamores de seu povo.
Cacique Serigy vive! E sua luta nos encoraja.
Bispo do Rosário vive! E sua arte nos inspira.
Com as bordadeiras da Casa dos Saberes e dos Fazeres em São Cristovão |
Com o mestre Nivaldo e companheiras de viagem em São Cristóvão |